segunda-feira, 13 de novembro de 2017

Vestimentas e ordens iniciáticas

Recentemente, presenciei uma discussão em um grupo maçônico no Facebook (não lembro ao certo qual era o grupo, porém não consegui mais encontrar o tópico de discussão) sobre se o uso obrigatório do terno em reuniões maçônicas, como é costume no Brasil, deveria ser abolido.

Traje maçônico no Rito Brasileiro.

























Apesar de entender que sim, o uso obrigatório do terno deveria ser abolido, entendo que alguns argumentos sejam razoáveis para uma padronização da vestimenta (sendo o terno ou outra vestimenta padronizada). Porém, o que mais me assustou, foram alguns argumentos sem pé nem cabeça que foram apresentados (e mais do que apresentados, impostos como a verdade absoluta):

O terno evita que existam diferenciações e ostentações entre irmãos: Mentira. Ternos não são todos iguais e certamente os irmãos que quiserem ostentar roupas de grife poderão se apresentar com ternos mais requintados do que os irmãos que usam ternos mais simples. Além do mais, apesar do terno ser usado em situações de trabalho (seguranças, motoristas particulares, advogados, etc), geralmente ele é associado com luxo, glamour, ostentação, sofisticação e neste caso, mesmo o polêmico balandrau, seria mais eficaz do que o terno (além de mais prático). O que inclusive nos leva para o segundo argumento apresentado.

Clique para ampliar. Os comerciais de perfumaria e outros usam homens de terno como sinônimo de elegância a muito tempo. Anúncio de: www.facebook.com/blessrj
O terno é simbólico: Esse chega a ser cômico. Antes de mais nada os maçons, simbolicamente, são pedreiros (construtores). Seu trabalho braçal exigia o uso de aventais para a sua proteção, mas também exigia muito esforço físico (por isso que dos Landmarks de Mackey os deficientes físicos não eram aceitos na corporação). Só por isso daí já vemos que o terno e gravata não faz parte do simbolismo maçônico, algo reforçado pelo simples fato dele não estar presente no mundo todo. Lembro que alguém utilizou como desculpa o seu rito "precisar" de terno, desconheço tal afirmação, mas vamos fazer uma outra comparação: O Rito Schroeder exige o uso de cartola, portanto todos os maçons de todos os ritos e potências devem ser obrigados a usar cartola apenas por uma exigência daquele rito ou por ser algo do rito deve ser aplicado apenas nas lojas do mesmo? Já imaginou alguém lapidando pedras e fazendo uma construção de terno e gravata? Deve ser uma cena no mínimo interessante.


Tirar o terno seria não levar a sério a Maçonaria: Parece que os irmãos brasileiros acreditam piamente que a maçonaria foi inventada com terno e que isso faz parte obrigatória do ritual (não sendo algo de legislação local), como se o terno fosse algum landmark ou algo do tipo. Um dos maçons no grupo chegou a dizer que falar em abolir o terno era sinal de que a pessoa foi mal indicada e mal instruída em sua loja, PASMEM! Infelizmente tive que alertar ao mesmo que má instrução era desconhecer como essa obrigatoriedade não existe em outras partes do mundo (onde há uma maçonaria inquestionavelmente das mais sérias):

Loja maçônica de militares no Afeganistão.
http://www.lodgelordbruce.co.uk/afghanistan.html













































http://www.modestomasoniclodge.org/blog/?p=276























Para muito além do fator de praticidade, já que cada vez menos profissões exigem o uso de terno e muitas inviabilizam o uso do mesmo (eu mesmo sou professor de crianças, quem já tentou dar aula para crianças usando terno já sabe o problema que é) e acabam exigindo que o irmão tenha que ficar se deslocando com uma mala de roupas. A idolatria ao terno é excludente e coloca o significado da iniciação em algo exterior, quando deveria ser valorizado o interior. Ou será que algum irmão se sente mais dedicado que os nossos irmãos do Haiti?

http://blogdamaconaria.blogspot.com.br/2010/05/maconaria-no-haiti-pos-terremoto.html#.WgmpyNynHIU















Evidentemente que não estou falando dos paramentos (avental e alfaias no caso da maçonaria), esses de fato devem ser obrigatórios (salvo em casos extremos). Porém, a questão da vestimenta civil mesmo que não cabe ser regulada pelas ordens, embora até compreenda que o seja em eventos excepcionais e não nas reuniões ordinárias.

Interessante é notarmos algo que está escrito no Fama Fraternitatis, primeiro dos manifestos rosacruzes, sobre o uso de um hábito (vestimenta) específica pelos membros da fraternidade:
"Segundo, Nenhuma das gerações futuras deveria ser obrigada a usar um determinado tipo de hábito, mas em cada lugar seguir o costume do país."

Chega a ser curioso vermos que os irmãos maçons, do grau de cavaleiro rosa-cruz, acabem ficando presos ao uso de uma vestimenta civil específica por conta das regulamentações maçônicas locais. De qualquer forma, o problema maior não está nem no uso ou não de determinada vestimenta (embora exista a questão da praticidade envolvida) e sim na idolatria e sacralização do que é exterior e banal. Se valorizamos elementos exteriores como aquilo que é essencial para a ordem, não será de se estranhar que cada vez mais tenhamos uma ordem tomada por vaidades e outros sentimentos negativos, quando deveríamos ter pessoas preocupadas com a transformação interior.